O som de um sino de igreja é igual em todo mundo, concorda? Pois era o que pensava um engenheiro de som que chefiou o projecto que abrigou o Camatondo. Mas a guionista da radionovela, Inês José, mostrou como os sinos dobram diferente em Angola, como ela nos conta:
"Lembro de uma vez quando rodamos a cidade de Luanda de cima a baixo à procura de um lugar onde pudéssemos improvisar o som de um sino de Igreja. Meu chefe, um engenheiro de som canadiano, pensou que eu estava procurando apenas um pretexto para sair do escritório, e me disse que tinha uma biblioteca sonora com todos os sons que se podiam imaginar. Por isso eu não precisava sair.
Eu disse que não seria apropriado porque eu preferia o som de sino de Igreja do meio rural angolano. E ele, sem entender, olhou pra mim desconfiado e disse: ‘mas, Inês, que diferença tem o som do sino de uma Igreja em Angola, no Canadá, na Inglaterra ou nos Estados Unidos? É tudo sino de Igreja! É tudo igual!’
E eu lhe disse não. O sino de uma Igreja do meio rural angolano é diferente do sino de qualquer Igreja, até mesmo das de Luanda. No meio Rural, o sino de Igreja é uma improvisação. O pessoal prende um objecto metálico numa árvore ou num tronco, (normalmente uma jante de carro ) e bate neste objecto, fazendo de conta que é sino (fotografia abaixo). É claro que o som é bem diferente do sino de uma Igreja moderna!
E ele espantado olhou pra mim e perguntou: Ai é?
Quando encontramos finalmente o lugar sem o barulho infernal do trânsito e nos pusemos a improvisar o sino, as pessoas nos olhavam sem entender. De certeza que eles estavam a perguntar-se se nós estávamos malucos.
É por isso que até hoje as pessoas continuam a perguntar: mas onde é que vocês gravam o Camatondo? Quando a gente diz que é gravado na Rádio Nacional, alguns continuam teimando: “ Não pode! Os sinos, os cães, as galinhas, aquilo tudo parece mesmo na aldeia! Não pode!!
Boa parte desta magia é feita pelos dedicados sonoplastas da Rádio Nacional, como Luis Pedro, Adão Paciência e o Diogo Manuel que conseguem fazer com que os ouvintes se sintam em casa em Camatondo!!"
A viagem da equipa de Camatondo ao Bié ainda rende frutos. A guionista da radionovela, Inês José, conta que ouviu muitas sugestões no Road Show que serão aproveitadas na radionovela:
“Foi o máximo esta viagem ao Bié! Aprendi tanta coisa! Uma delas foi o ritual do casamento antigo. Os sobas nos explicaram com todos os detalhes. Essa informação veio mesmo a calhar, porque o Jeremias está de regresso e possivelmente vai se casar. Será que a moça com quem ele vai se casar é virgem? E se não for, o que ele vai fazer?
No Município do Cunhinga, ouvimos sugestões dos jovens que nos disseram: “Vocês deviam falar também sobre o que está a se passar aqui. Quando um jovem estuda bem, tenta subir na vida, os mais velhos não gostam, porque pensam que assim vai lhes tirar o lugar. O jovem não vai longe, sem mais nem menos, só vemos que ele morre”. Mas morre como? Por quê? “É feitiço dos mais velhos! Esses kotas é que fazem feitiço pra os jovens que estão a estudar bem, pra não lhes tirar o lugar. Já aconteceu aqui com alguns. Estavam a estudar muito bem, e sem mais nem menos eles morreram”.
Kotas, kotas!!!! É verdade? Como é que o país assim vai crescer? Não pode! O Jeremias está a voltar! Ele tinha ido tirar o curso de desenvolvimento comunitário em Luanda. Será que também vão lhe enfeitiçar?
(Na foto, o actor Augusto Alfredo, que interpreta Jeremias, entrevista um ouvinte)
Bem, é só acompanhar Camatondo pra ver o que vai acontecer!
Pra saber isso tudo, é só estar conectado a Camatondo às segundas e quartas-feiras, às 5.30 da manhã. FM 93.5, na Rádio Nacional de Angola . Se estás na província, veja o horário da radionovela na sua emissora provincial.
A música Criança Feliz, do grupo H.Q., tem estado a fazer muito sucesso.
E tudo começou de um jeito casual, como conta a guionista de Camatondo, Inês José:
“
Na fila do Departamento de Emigração e Fronteiras de Angola(DEFA), conheci a Filomena, que disse que tinha uma sobrinha, Mila, que gostava muito de cantar, mas que não tinha oportunidade. Disse a ela que a menina poderia cantar em Camatondo. No dia combinado, Mila foi ao meu escritório com um CD. Não gostei muito da música que ouvi e perguntei se ela poderia compor uma música com mensagem: “uma criança falando para os adultos. Fale das coisas que os adultos fazem e que muitas vezes ferem as crianças. Fale da forma como você gostaria que os adultos tratassem as crianças”- falei.
No dia seguinte, ela me trouxe a nova música e, quando eu li, mesmo antes de ouvir a melodia, disse: “ Está decidido! Vais cantar essa música no Camatondo! Escolhi a música por causa da mensagem. Tinha muito a ver com o tema que estamos a abordar, da fuga à paternidade.”
No dia marcado, o grupo foi ao Camatondo e participou das gravações. Quem não dançou? Até os actores ficaram todos crianças! No final da gravação, o realizador do programa Geração Viva convidou-os para uma entrevista.
Após o episódio do qual os meninos participaram, a tia de Mila me ligou: “Dona Inês, nem imagina o sucesso que a música está a fazer! A minha sobrinha hoje foi a Viana e encontrou algumas crianças a cantar a música! Como eles não se lembravam da música toda, só cantavam: Quem é criança bate palmas aya aya!”.
O pessoal da rua deles ficou sabendo que os meninos iriam ao programa Geração Viva e puseram o rádio ligado bem alto na rua pra todo mundo escutar. Quando eles voltaram, os vizinhos só gritavam: criança feliz!!
Então, quero dar os parabéns ao grupo H.Q. pela música e pela persistência deles.
E se Camatondo ajuda a realizar sonhos simples das crianças, então isso traz muita alegria mesmo!
Em maio, Camatondo discutiu temas relacionados à família. Em um dos episódios, foi convidado o escrivão de direito do Tribunal da Família Paulo Jacinto (na foto), para falar sobre fuga à paternidade.
Mas a participação do escrivão não ajudou apenas os ouvintes. Depois da gravação, os actores também ficaram a querer saber mais do senhor Paulo. Um deles era o actor Rodrigues Artur (“Soba Chipaca”), que tinha uma sobrinha de 16 anos, grávida de um senhor casado, que vivia dizendo que a gravidez não era dele.
A família culpava a menina que, segundo eles, foi a bandida, e estavam para expulsá-la de casa. Mas o Sr. Rodrigues pediu à família que, antes de expulsar a menina, escutassem o episódio que iria passar naquela quarta-feira. Depois da família escutar o episódio, decidiu seguir as orientações que foram dados pelo Sr. Paulo Jacinto, escrivão de direito na radionovela Camatondo. Presentemente, marcaram audiência no Tribunal da Família para serem ouvidos e solicitarem a ajuda necessária para obrigar o homem a cumprir com as suas responsabilidades.
Ouça agora o episódio 241 de Camatondo, emitido no dia 07 de maio de 2010, com a participação do escrivão de direito Paulo Jacinto:
A equipa de Camatondo recebe centenas de cartas de ouvintes. Mas uma carta, em especial, marcou muito, como conta a coordenadora da radionovela, Inês José:
Nós a recebemos no dia em que estávamos a realizar a última gravação do Camatondo ainda como projecto das Nações Unidas. Última? Sim, última, porque, daí em diante, iríamos parar por falta de fundos. Recebemos a carta no dia em que dei a notícia aos actores: não podíamos continuar, pois não havia mais condição de pagar nenhuma despesa. Eu leio para eles todas as cartas que nos são enviadas. E esta não foi excepção, e tanto mais que o ouvinte a havia enviado através da caixa postal da Rádio Nacional. Portanto, nós todos recebemos a carta quando estávamos no estúdio a gravar. Antes da gravação, eu falei com os actores para dar a notícia da nossa paragem. E depois, para confortá-los, li a carta do ouvinte Júlio Nascimento e terminei dizendo: “esta carta é prova de que o nosso esforço não foi vão. Há ouvintes que gostaram muito do que foi feito, e que vão se lembrar sempre de Camatondo com saudade.
Geralmente, quando se recebe a carta de um ouvinte, os actores vibram. Mas essa carta teve para eles o peso de uma notícia de óbito. Luto. Eles sempre acreditaram no que eu lhes dizia. Mas, naquele momento, diante dessa notícia, eles não acreditavam e perguntavam: “Inês, mas vamos fechar mesmo?”
Nos dias que se seguiram, foi uma avalanche de telefonemas de muitas partes do país. Ouvintes perguntando o que se passava com Camatondo? Por que estavam a ser repostos alguns episódios, em vez de ouvirem episódios novos? As rádios provinciais ligavam para o Gabinete das Emissoras Provinciais da Rádio Nacional de Angola perguntando: “os ouvintes aqui nas províncias estão a nos incomodar sobre o Camatondo e nós não sabemos o que responder”.
Foi por isso que nasceu a PROMÉDIA. Para dar um novo pai a uma criança abandonada. Um pai angolano! A PROMÉDIA - Programa de Comunicação para o Desenvolvimento Sustentável em Angola - é uma ONG nacional que trabalha com as comunidades para que elas conheçam e adoptem boas práticas para o desenvolvimento sócio-económico, ajudando –as a assumir responsabilidades para melhoria das suas condições de vida.
E assim, graças à PROMÉDIA, que conta com um patrocínio da Associação das Empresas do Bloco 15, Camatondo continua a ser emitido!